10
Nov 09

 

 

publicado por Rita Mello às 16:39

20
Mar 09

Os dinossauros conseguem mover-se com rapidez mal o cérebro esteja em pleno funcionamento. Depois do meu encontro com a Juliette aconteceram bastantes coisas; o elenco começou a ser reunido; o argumento foi várias vezes reescrito; a data para o início das filmagens foi fixada para 2 de Maio. Não tenho um quarto para visitas em casa, por isso, a Juliette teve de dormir na cama da Anouchka (rodeada de brinquedos e de retratos de astronautas), enquanto esquadrinhávamos todas as linhas do argumento de Chocolate, fazendo alterações à medida que avançávamos. Ela leu a  sua parte em voz alta; eu li o resto. Bebemos litros de chocolate quente. E eu continuei a beliscar-me.

Uma das razões porque me lembrei da Juliette para o papel foi o facto de ela ter uma criança da mesma idade que a minha filha Anouchka, que tem um papel de destaque no livro. A relação entre mãe e filha é a mais forte da história, e tinha esperanças de que trouxesse alguma da sua experiência para o papel. E tinha razão; ela e a Anouchka deram-se lindamente (apesar da Anouchka insistir em referir-se a ela como “Juliette Brioche”), e tínhamos todas um forte pressentimento de que o Pantoufle, o coelho invisível da minha filha (com um papel-chave no livro) se transformara, cortesia da Miramax, num canguru. Infelizmente, apesar disso, o canguru continuou lá. É o meu único arrependimento.

No entanto, fizemos progressos no argumento. Em circunstâncias normais, apenas teria tido um pequeno envolvimento por cortesia, como bem sabe quem já vendeu a alma a Hollywood, mas é incrível o que podemos fazer quando temos uma grande estrela do nosso lado. A maior parte das minhas sugestões foram adoptadas. De repente, fui consultada para uma série de coisas, desde a banda sonora até à forma correcta para lançar runas. As saquinhas vermelhas de boa sorte que Vianne pendura por cima das portas foram levadas de minha casa pela Juliette durante a sua estadia. Até agora, acho que a sorte está a funcionar.

As filmagens começaram na semana seguinte em Bath, depois em França. Passei as últimas duas semanas no local de filmagens em Shepperton, onde a maior parte dos cenários interiores foi construída. Era, simultaneamente, muito e pouco parecido com o que tinha imaginado. Os cenários eram perturbadoramente familiares; reconheci a casa da minha avó em França, bem como o quarto dela e todos os tachos e panelas que estavam pendurados na parede; a chocolataria era exactamente como a tinha imaginado, mas para melhor, com filas de frascos de compotas nas paredes e as estranhas figuras mexicanas a guardar o tesouro de chocolate. Havia até uma homenagem ao Pantoufle original na janela – um coelho de chocolate e maçapão com uma capa e um chapéu de mágico. Encontra-se agora no quarto de Anouchka. O facto de ela ainda não o ter comido é o maior elogio que consigo imaginar.

O chocolate é uma substância que provoca alterações de humor. Suspeitei sempre disso (em doze anos de ensino, nunca me desiludiu) e, finalmente, vi a prova durante as filmagens de Chocolate. O local das filmagens consegue ser um lugar muito stressante. Os orçamentos, os prazos, os conflitos pessoais são indicadores de que os ânimos estão muitas vezes exaltados, especialmente quando o tempo avança. Mas aqui não se passou nada disso. Parecia que toda a gente se estava a divertir. Lasse Hallström (que tinha imaginado ser uma figura assustadora com um boné e um megafone) foi encantador, nunca levantando a voz ou dando qualquer sinal de impaciência. O aroma do chocolate proveniente do fogão portátil atrás do cenário era tão forte que actores de outros cenários arranjavam desculpas para se deixarem ficar por lá, a sentirem o aroma com inveja. Apesar do frenesim atrás dos bastidores, ninguém parecia estar demasiado ocupado para falar comigo. Havia uma atmosfera de energia criativa e alegre. Até o fotógrafo estava a sorrir. Só podia ser do chocolate.

No entanto, quando tudo acabou, eu sabia que tinha tido muita sorte. Sentia-me como alguém que vagueara por um perigoso labirinto, andando à sorte, e que, contra todas as probabilidades, tinha atingido às cegas o prémio final. Isso fez-me sentir um pouco culpada e quase que quis odiar o filme, como se fosse uma compensação por ter tido um percurso tão fácil até aí. Mas não o odiei. Foi tudo o que esperei que fosse, caloroso, divertido e descontraído, com ironia suficiente para não ser lamechas. Ao estar sentada a vê-lo pela primeira vez em Nova Iorque, a comer pipocas e a ver os créditos a passar, pergunto-me cautelosamente se já é seguro começar a acreditar em tudo isto.

publicado por Rita Mello às 12:12

18
Mar 09

Quando escrevi o livro, eu era uma professora de Francês numa escola para rapazes em Leeds. E ainda são muitas as vezes que me vejo a mim própria assim. É fácil viver num mundo de fantasia quando a vida real se resume à rotina, mas quando a realidade começa a pregar-nos partidas, as coisas complicam-se. Foram muitas as vezes, nestes últimos três anos, que dei por mim genuinamente sem ter a certeza se me encontrava a sonhar ou não.

Suponho que tudo tenha começado com a Juliette Binoche. Jogando ao jogo de “e se…” (e se o meu livro fosse publicado, e se viesse a dar um filme, e se eu pudesse escolher alguém para o protagonizar…), vi tudo com nitidez antes mesmo do livro estar concluído. Alguns dos detalhes foram alterados, alguns actores foram entrando ou saindo das boas graças, mas na minha mente sempre vi a Juliette Binoche como Vianne. Sabia que ao assinar o acordo de transposição para o cinema, dera à Miramax o direito de localizar o filme no espaço, se eles bem entendessem, mas, mesmo assim, continuei a mencionar a Juliette Binoche a toda a gente que ia conhecendo, como se através de um processo de desgaste eu pudesse levar a minha avante.

A indústria cinematográfica é como um enorme dinossauro; demora imenso tempo para que as ordens do cérebro cheguem às várias partes do corpo, e depois de assinar o acordo não ouvi falar mais de Chocolate durante dezoito meses. Não era nada que não estivesse à espera; sabia que a maior parte dos livros com direitos vendidos para o cinema não chega aos ecrãs e que a maior parte dos projectos cinematográficos são abandonados no último minuto. Um sábio amigo meu disse-me que, no que toca a Hollywood, só deveria acreditar nas coisas quando estivesse no cinema a ver os créditos a passar. Era um bom conselho. Apesar disso, continuava a mencionar a Juliette Binoche sempre que alguém me ouvia.

Depois, começaram os primeiros rumores. A Internet é um excelente sítio para se estar a par de rumores. A maior parte da informação que tive veio daí; o nome do argumentista; o debate em torno do elenco; a contratação de Lasse Hallström para realizador. A Miramax permaneceu teimosamente silenciosa, mas era óbvio para mim que algo estava a mexer dentro do dinossauro de Hollywood. Recebi uma cópia do argumento de Bob Jacob para ler; gostei bastante, apesar das alterações na história. Mas continuei a não ter expectativas.

Seis meses depois, os rumores subiram de tom. E começaram a contradizerem-se; um dia a Miramax tinha escolhido a Gwyneth Paltrow, no outro a Julia Roberts, depois a Whoopi Goldberg. Ninguém parecia ter prestado atenção às minhas dicas em relação à Juliette Binoche.

Até que ela me telefonou. Tinha lido o livro e falado com o Harvey Weinstein para lhe dar o papel. (Porque não me tinha lembrado disso? Mas suponho que isso só funcione quando se é a Juliette Binoche.) Ela lera o argumento mas tinha algumas reservas em relação a partes dos diálogos. Podia encontrar-me com ela em Paris para discutir isso?

Este foi o momento em que comecei a questionar a minha noção da realidade. Nada na minha vida em Barnsley ou a ensinar na Leeds Grammar School me tinha preparado para isto. Encontramo-nos num café para tomar chá, comer bolos e rever o argumento (houve um momento maravilhoso quando o garçom altivo que me ignorara ao sentar-me se apercebeu subitamente de quem eu estava à espera). No grande ecrã, a Juliette parece muitas vezes etérea e um pouco melancólica; na vida real, é divertida, cheia de vivacidade e muito inteligente. Ele desempenha o papel de estrela extremamente bem quando é preciso (nas estreias e com jornalistas mal-educados), mas acima de tudo é uma pessoa normal com um emprego a sério. Falámos durante horas; quando superei o meu temor, descobri que tínhamos muitas coisas em comum. Chegámos à conclusão de que precisávamos de falar mais, e a Juliette fez-se de convidada para passar um fim-de-semana em minha casa no mês seguinte, para revermos o argumento detalhadamente.

(Segunda parte de um artigo da autoria de Joanne Harris, publicado no Daily Telegraph, sobre a adaptação de Chocolate ao cinema. Não perca o resto.)

publicado por Rita Mello às 10:26

17
Mar 09

A praça da aldeia está coberta por uma leve camada de neve. Algumas pessoas de chapéu e casaco de inverno jogam pétanque, enquanto um grupo de crianças aglomera-se junto de um terrier. Três senhoras de idade vestidas de preto atravessam a praça, detendo-se momentaneamente para espreitar para a montra de uma das pequenas lojas que está virada para a igreja. À primeira vista, esta cena parece quase real.

É claro que há coisas que não batem certo. O calor pouco usual para a época. O misterioso mas tentador aroma do chocolate. E o facto de uma das senhoras de idade parecer suspeitosamente com Leslie Caron, que interpretou o papel de Gigi, no musical homónimo, há quase meio século.

Não obstante estes detalhes, a ilusão é quase perfeita. E é bom que o seja; a praça principal desta aldeia francesa foi cuidadosamente recriada pedra a pedra. Reconheço-a instantaneamente, apesar de nunca ali ter estado. Reconheço a loja também, apesar do nome ser diferente. Reconheço as pessoas, apesar de nunca nos termos conhecido. E até reconheço o cão. Fazem todos parte do meu romance Chocolate, e este é o cenário do filme.

A cena tem os elementos surreais de um sonho. De um dos lados, consigo ver a Carrie-Anne Moss envergando um impecável saia-casaco, pérolas, chapéu e luvas brancas e passando a alta velocidade numa pequena scooter por uma mesa comprida coberta de bolos; Juliette Binoche está sentada numa cadeira de lona enquanto lhe arranjam o cabelo; uma pequena rapariga com uma capa vermelha está a trepar um andaime e, ao dobrar a esquina a seguir a uma enorme fileira de luzes, vejo uma mulher sozinha na semiescuridão, a mexer um grande tacho num fogão portátil. Aproximo-me e descubro que o tacho tem chocolate derretido. O aroma que emana é tão forte e rico que enche todo o lugar, aldeia incluída. Dispostas à minha frente, em mesas compridas, estão centenas de figuras de chocolate de todos os tamanhos e feitios; coelhos, cordeiros, peixes, galinhas. E todas elas parecem olhar-me nos olhos. É o suficiente para qualquer pessoa perder o sentido da realidade.

As pessoas perguntam-me com frequência: alguma vez imaginou que isto pudesse acontecer?

De todas as perguntas que tenho de responder, esta é a que mais me assusta. Poderia ter alguma vez imaginado que o meu pequeno livro, escrito nas manhãs de domingo entre o meu emprego como professora e a minha filha de três anos, iria provocar tudo isto?

É claro que sim. No fim de contas, é isso o que eu faço. Imagino coisas.

No entanto, não espero que elas se realizem.

(Primeira parte de um artigo da autoria de Joanne Harris, publicado no Daily Telegraph, sobre a adaptação de Chocolate ao cinema. Não perca o resto nos próximos dias)

publicado por Rita Mello às 09:57

30
Dez 08

          

Realizado por Lasse Hallström e protagonizado por Johnny Depp e Juliette Binoche, a adaptação ao cinema de Chocolate foi um enorme sucesso, tendo o filme sido nomeado para cinco Óscares em 2001.

Deixo também aqui para vocês verem um vídeo com algumas imagens de Johnny Depp...

 

publicado por Rita Mello às 14:32

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